Vivendo a crise dos 20 e poucos anos
Fazendo um trocadilho com a Sandy, “sou jovem demais para ser adulta, adulta demais para ser adolescente”
No sábado, na minha última sessão de terapia, em algum determinado momento entre a minha tagalarice, olhei para a minha psicóloga e disse: “eu acho que estou vivendo a crise dos 20 e poucos anos”. Ela me olhou e gentilmente me perguntou: por quê? Naquela hora, confesso, não soube explicar. A minha vida tem mudado tanto nos últimos dias que, sinceramente, minha cabeça está tão cheia de pensamentos que até mesmo raciocinar está sendo difícil. Mas eu sabia que estava passando por uma crise existencial.
A verdade é que a vida não está sendo como eu planejei (será que algum dia será?). Eu tinha aquela doce ilusão de que, após sair da faculdade, eu estaria em um patamar completamente diferente. Na minha imaginação, eu já seria uma mulher bem-sucedida, morando sozinha e colhendo os frutos de tantos anos dedicados durante a graduação. Eu viveria finalmente os meus anos dourados. Não me levem a mal, mas qualquer criança dos anos 2000 que cresceu assistindo comédias românticas já se imaginava tendo uma vida relativamente parecida com aquelas que víamos nas telas de cinema.
Eu sempre soube que, se eu quisesse mudar de vida, eu teria que batalhar (e estudar) muito. E talvez, por eu já vir batalhando há tanto tempo (antes mesmo da faculdade), tinha a ilusão de que as coisas não demorariam tanto para acontecer. Mas é aí que vem a maior piada da vida adulta: as coisas levam tempo e nem sempre (ou quase sempre) elas não serão iguais como planejamos.
Eu tenho a impressão de que a gente só aprende a viver realmente a nossa fase adulta quando saímos da faculdade (principalmente se você, assim como eu, entrou logo após o ensino médio sem ter muito tempo para pensar direito). Sinto que após eu me formar, foi que aprendi a enxergar a vida como ela é sem aqueles óculos cor-de-rosa que, de uma maneira ou outra, a graduação nos coloca. E não nego, não está sendo nenhum pouco agradável.
Não sou uma louca que vive no mundo da lua, mas sou muito sonhadora, o que me faz questionar constantemente: será que a vida é só isso? Será que é preciso doer tanto para que, só no fim, as coisas comecem a dar certo? E no meio desse fim, será que há uma vida boa o bastante para ser vivida? Será que a vida adulta é tão sufocante ao ponto de eu me questionar constantemente para onde foi aquela menina cheia de vida que eu era anos atrás?
Talvez por vivermos em um mundo cada vez mais conectado, é normal nos depararmos com pessoas que vivem uma vida relativamente parecida com aquilo que sonhamos. Não vou negar, sempre fico com um pouquinho de raiva quando vejo uma pessoa com a minha idade na internet comprando a casa própria, viajando para lugares que eu gostaria, tendo uma rotina “perfeitamente agradável”, e às vezes, essas pessoas nem estudaram tanto quanto eu. No fim, acabo me questionando: o que estou fazendo de errado?
Eu sei que jamais devemos comparar as nossas vidas com as vidas de pessoas que vemos na internet, afinal, tudo aquilo postado nada mais é do que apenas uma pequena parcela do que é a realidade. Porém, por mais que eu tente, às vezes fica inegável não se comparar.
E quando essa comparação se mistura com a realidade, dói. Porque você começa a questionar todas as suas decisões tomadas até aqui. Você se questiona se escolheu a profissão certa, se questiona sobre o seu estilo de vida, sobre as roupas que usa, o que deixa ou não de postar, e até mesmo sobre suas emoções e pensamentos.
A verdade é que virar adulta não é uma tarefa fácil. Infelizmente, não vem com um manual de instruções. Eu sei que hoje a minha responsabilidade é continuar trabalhando e estudando para alcançar o que desejo, mas essa não é uma realidade de muitos. Eu ainda vivo uma realidade, embora muitas vezes eu não perceba, extremamente privilegiada. E aqueles que muitas vezes a realidade nem permite terem uma perspectiva de vida?
Eu acho que a crise dos 20 e poucos anos nem sempre é sobre estarmos completamente incertos sobre o que queremos. Mas, de certa maneira, a mídia nos faz acreditar que essa década é a mais importante. Como se nada der certo, se não criarmos uma carreira sólida, se não casarmos ou tivermos filhos, nossa vida estará perdida. Como se nossa vida fosse acabar automaticamente aos 30, como se a nossa expectativa não fosse viver até os 80 anos, como se ainda não tivéssemos 60 anos pela frente e pudéssemos recalcular a rota sempre que quisermos.
A gente bota tanta pressão em nossos vinte e poucos anos que esquecemos o privilégio de vivê-lo. Esquecemos o privilégio de errar, mas aprender com nossos erros; o privilégio de viver tudo como se fosse a primeira vez (pois a grande maioria é); o privilégio de mudarmos de opinião, desejo, voltar se for preciso ou até mesmo iniciar tudo do completo zero. Não que isso não possa ser feito em outras idades, mas acredito que o principal objetivo dos vinte e poucos anos é esse: ensinar. Porque quando chegarmos aos 30, 40 e precisarmos recomeçar tudo de novo, os nossos 20 nos ensinaram. E talvez, assim, a jornada fique um pouco mais leve.
Os 20 e poucos anos podem machucar. Podem bater até a gente sangrar. Podem dar na nossa cara até a gente aprender. Mas os 20 e poucos anos curam. Nos ensina, nos fortalece e até mesmo nos abre caminhos rumo à nossa melhor versão. E eu confesso que espero ansiosamente pelos meus 20 e poucos (ou os 20 e tantos) anos me curar.